Pular para o conteúdo principal

The Banshees of Inisherin: Novo longa de Martin McDonagh aborda a depressão e conflitos internos do ser humano


A depressão é uma doença que pode se manifestar de diversas formas em nós, seres humanos: isolamento social, automutilação, agressividade e profundas crises existenciais são apenas algumas das reações. Tais enfermos também podem ganhar potencialização com eventos negativos causados pela a nossa incrível capacidade de incompreensão e ganância. A sinopse de tudo isso pode ser conferido no mais novo filme de Martin McDonagh, intitulado The Banshees of Inisherin (EUA). Após a excelente direção para o bem humorado ‘7 Psicopatas e um Shitzu’ (2012) e a enxurrada de críticas sociais em ‘Três Anúncios para um Crime’ (2017), dessa vez Mc Donagh nos revela a sua faceta para histórias de caráter mais introvertido, singular e coloca em discussão esta questão que ainda é pouco explorada/tratada da forma que deveria ser em nossos lares e que tanto assola a sociedade moderna. Sem perder a sua identidade, o, relativamente novo, cineasta americano embrulha uma narrativa melancólica em um produto com dosagens sutis de humor.

A obra tem como destaques os atores e atrizes, Colin Farrell (Pádraic Súilleabháin), Breendan Gleeson (Colm Doherty), Kerry Condon (Siobhan Súilleabháin), Barry Keoghan (Dominic Kearney), Brid Ní Neachtain (Mrs O’Riordan), David Pierce (Priest) e Gary Lyndon (Peadar Kearney). O roteiro e direção ficou a cargo do próprio McDonagh. A distribuição é da Walt Disney Studio.

A trama é ambientada em uma pequena e fria ilha na costa oeste da Irlanda, período que ocorre a guerra-civil do país – confrontos que acontecem distante da península e que é pouco explorado, usado apenas como pano de fundo. Nesta mesma ilha vivem Pádraic (Colin) e Colm (Breendan). Os dois são amigos de longa data, porém por alguma razão, Colm decide encerrar a amizade entre eles, atitude que deixa Pádraic banstante surpreso e reflexivo. A partir desse momento o roteiro começa a se desenrolar e apresentar os personagens e suas peculiaridades em um cenário que representa a frieza e solidão – e para contrastar o clima mórbido, são acrescentadas dosagens de humor, uma das características do diretor – tanto que além do subgênero drama, foi agregado também o de comédia, nada explícito, claro.

Colm, em vários takes, revela-se um homem frustrado, o que faz acreditar que todo tempo, o qual ele considera perdido é devido suas escolhas, consideradas na própria visão, infelizes. Breendan ao representar o papel de um senhor –  sem grandes esperanças – cria um perfil muito realista, apenas com seus olhares e expressões é possível nos convencer do seu real estado de espírito, resultando em um ser conflitante consigo mesmo e que procura respostas para acreditar na própria existência. Colin também merece destaque por se encaixar exatamente em um Pádraic perdido e de poucas ambições – para ele, a simples rotina de um vilarejo e beber algumas cervejas no pub da vizinhança já é o suficiente. A relação entre Colm e Pádraic exige cargas cômicas para revelar o triste desfecho de uma amizade duradoura. É nesses momentos que a marca de McDonagh fica mais latente: diálogos sem pretensões de arrancar gargalhadas do público mas que passa certa leveza e nos provoca tímidos sorrisos.

Ainda sobre as atuações, também podemos destacar alguns outros nomes que ajudam a montar os diversos perfis que estão sempre em confronto com os seus próprios “demônios”. Barry Keoghan tem performance notável ao transparecer o jovem Dominic, este que subjetivamente revela constantemente suas desilusões e segredos, os quais acontecem no convívio familiar – no caso, a família é somente ele e o pai, o agente Peadar (Gary L.). Peadar é um Guarda Civil, senhor isolado, de vícios e que mantém uma relação abusiva com o filho. Uma das poucas figuras femininas do elenco é a de Kerry C., a reservada Siobhan – irmã de Pádraic. Kerry faz de Siobhan uma figura extremamente arisca, de pouca interação social, entretanto ela reconhece os dilemas que há dentro de si mesma e busca soluções para tais. No contexto geral, todos eles têm uma característica em comum: a solitude. O vazio e o recolhimento social é a tônica que Mc Donagh busca passar; retratar ao espectador o exílio que os cerca e o quanto o ambiente, além da personalidade, pode influenciar para um profundo quadro de tristeza, mesmo que, em alguns momentos, não velada.

A locação escolhida pela produção - uma ilha gelada, distante do calor humano e que sofre com os reflexos da guerra, imprimi muito bem a conexão e influência que ela tem para com os personagens. Trata-se de um local pouco atrativo, sem muitas atividades a se fazer e que nos leva a um único caminho para se divertir ou matar as horas angustiantes: o pub. Tomar cerveja, ouvir música e jogar conversa fora é quase que um ritual para os moradores. E é justamente esse tipo de ambiente que pode influenciar a feição das pessoas e as levarem a estágios de consternação – seja de forma mais retida ou explícita – como, por exemplo, os casos dos protagonistas citados.

The Banshees of Inisherin é uma película carregada de tópicos que expõe nossas feridas, nos leva a compreender ou provocar muitas questões internas. Como já citado, as ótimas atuações de Farrell e Gleeson ajudam a traduzir de forma compreensível sobre a mensagem a se passar. Martin conseguiu sintetizar temas delicados em um trabalho impecável e com enredo muito bem amarrado. Certamente, ao término da sessão, é possível que você se identifique com muitas das situações ou que vá aspirar fácil a atmosfera e situações em que os moradores daquela ilha estão envolvidos. Não é à toa que estamos falando de um longa com o maior número de indicações ao Globo de Ouro – oito no total (este texto foi escrito antes da cerimônia de premiação). E não seria um exagero afirmar que Os Banshees também estará compondo algumas categorias da lista do Oscar deste ano. 


Postagens mais visitadas deste blog

TRILHA COMENTADA - Contrabando

  Há quem diz que uma trilha sonora vem a calhar mais que o filme em si – eu sou um desses. É o caso da refilmagem de “Reykjavic-Rotterdan” (Islândia), só que em uma nova versão norte-americana do diretor Baltasar Kormákur, e com novo título: Contrabando. No elenco principal temos a participação de Mark Wahlberg (Planeta dos Macacos, Rock Star), Kate Beckinsale (Anjos da Noite), Bem Foster (360) e Giovanni Ribisi (Caça aos Gângsteres, Resgate do Soldado Ryan). A trama é razoável e previsível, resume-se em quadrilhas que realizam contrabando por meio de navios cargueiros. O que salva é a parte denunciante sobre o envolvimento de autoridades no esquema.  Já Clinton Shorter foi muito feliz na s ua função – Clinton foi responsável pela trilha sonora do longa. Logo no inicio o espectador escuta o conjunto de  J Roddy Waltson And The Business, da cidade de Menphis/EUA,  com a música “ Don´t Break The Needle ”, a mesma esbanja seu Blues com pitadas de Hard. ...

ENTREVISTA: Soulspell Metal Opera

Quem pensa que o metal melódico - gênero que sobreviveu em alta por quase uma década (1996 - 2005) - está morto e enterrado, talvez esteja um pouco equivocado. O estilo que trouxe opiniões de difícil aceitação por parte de extremistas está vivo e muito bem criativo, e a maior prova é a opera metal Soulspell. O Soulspell é um projeto que reúne diferentes vocalistas do Brasil e do mundo. O mentor de todo o projeto é o paulistano Heleno Vale. Heleno criou o primeiro álbum de seu projeto em 2008, intitulado de "A Legacy Of Honor" - que apresenta apenas vocalistas nacionais (Mário Linhares - Dark Avenger, Leandro Caçoílo - Ex-Eterna, Daisa Munhoz - Vandroya dentre outros grandes vocalistas e instrumentistas). Conversei com Heleno sobre seu novo trabalho, "Labyrinth Of Truths", detalhes do conceito que se passa na opera e futuros projetos que envolve o Soulspell. Recomendo que o leitor conheça mais sobre este conjunto, principalmente detalhes sobre o novo lançament...

CURTA: Fernanda Lira (NERVOSA)

Um filme: Laranja Mecânica Uma trilha sonora: Kil Bill Vol. 1 & 2 O filme que você empresta e faça questão que não devolva: Se eu tivesse algum filme de comédia romântica, até pagava pra pessoa não me devolver. Água com açúcar que já assistiu mais de uma vez: Titanic! hahaha Quem não assistiu mais de uma vez tá mentindo! Cinema nacional: O Cheiro do Ralo O mais nostálgico: O Fabuloso Destino de Amelie Poulain Um filme relacionado ao rock: Cadillac Records Uma comédia: O mentiroso (Jim Carrey é MESTRE) Lição de vida: Beleza Americana ou Morangos Silvestres do bergman

TRILHA COMENTADA - Os Infratores

Com direção do australiano John Hillcoat (conhecido por dirigir vários trabalhos da banda Depeche Mode), o longa baseado no livro Westtet County (Matt Bondurant), "Os Infratores", traz uma bela viagem aos anos da "Lei Seca" -  e uma rica trilha sonora calcada na música Folk, Country e Rock. A trama do filme é focada na vida dos irmãos Boudurant, Forrest (Tom Hardy), Howard (Jason Clarck) e Jack (Shia Lebeouf). Liderado por Forrest, eles produzem whisky durante o período da Lei Seca, com o alto sucesso de vendas, a família pretende expandir  os negócios, só que não é uma tarefa nada fácil, pois, autoridades e gangues superiores pretendem uma fatia no esquema.  Como sou um desses fascinado por trilha sonoras, logo fui buscar os músicos e conjuntos que  formam a trilha de OS Infratores. Nick Cave e Warren Ellis além de contribuírem com autoria de músicas foram os responsáveis pela seleção dos músicos convidados. Os dois foram muito felizes ...

Cinema de rua: Concha Acústica exibe gratuitamente a Amostra de Cinema Ibero-Americano

A Concha Acústica, localizada às margens do Lago Paranoá, vem sendo palco da Amostra Internacional de Cinema Ibero-Americano . A ação trata-se de uma parceria/realização entre o Brasília Capital Ibero-Americano de Culturas e a  Secretaria de Estado de Cultura e Economia Criativa  do DF (Secec-DF). Os obras cinematográficas começaram a serem exibidas na última segunda-feira (7) e terá a continuação nesta sexta (31), a partir das 19h, com o filme ‘ Terra de Panderos ’. Na sequência, o público poderá conferir ‘ Enamorada ’ (1946), do diretor Emilio Fernández . Fechando a noite, será a vez de ‘ La Odiosa Arrodilhada ’ (1947), dirigido pelo mexicano Roberto Galvadón . No sábado (1), as películas começam a rodar a partir das 15h (veja abaixo a programação completa), também será possível prestigiar filmes direcionados para o público infantil – ou seja, pais de plantão já tem para onde levar os filhos. Todo o acervo disponibilizado para o evento é pertencente às embaixadas da Espan...

GHOST no Brasil: Confira data, local e valores dos ingressos

A banda sueca Ghost acaba de anunciar show único no Brasil . A apresentação faz parte da divulgação do álbum ‘ Impera ’ (2022) – o mesmo foi aclamado pela crítica especializada e obteve a expressiva marca ultrapassando a casa de um bilhão de views nos canais de streaming. O quinto trabalho de estúdio também rendeu bons frutos para o grupo ao conquistar prêmios importantes no Grammy e American Music Awards. Quanto aos detalhes do show, o mesmo acontecerá na cidade de São Paulo , no Espaço Unimed , no dia 21 de setembro e com ingressos a partir de R$ 290,00 . Os ingressos estarão disponíveis a partir do dia 11 de abril para clientes que usufruem o cartão de crédito Porto Bank e para o público em geral será disponibilizado no dia 13 , pelo portal de vendas da Livepass . Serviços: Data:   21/09/2023 (quinta-feira) Local:  Espaço Unimed (Rua Tagipuru, 795 - Barra Funda - São Paulo / SP) Horário do show:  21h00 Ingressos:  a partir de R$ 290